Desigualdade no orçamento da cidade de São Paulo persiste mesmo com uso do IDRGP

Balanço do Índice de Distribuição Regional do Gasto Público 2024 mostra avanços, mas evidencia distorções na regionalização dos recursos

A cidade de São Paulo enfrenta há décadas um dos maiores desafios de sua gestão pública: a desigualdade regional na distribuição dos recursos do orçamento. Para mapear essas diferenças, a Prefeitura elaborou o Índice de Distribuição Regional do Gasto Público (IDRGP), uma ferramenta que busca orientar o repasse de verbas de maneira mais justa entre as subprefeituras paulistanas, que leva em conta a vulnerabilidade social, demografia e infraestrutura urbana.

Em junho de 2025, a Prefeitura divulgou o relatório referente ao IDRGP 2024, apresentando números sobre a aplicação do índice. O levantamento revela avanços importantes, mas também graves distorções na execução orçamentária.

O que é o IDRGP e como ele funciona?

O IDRGP é um índice criado para subsidiar a alocação de novos investimentos e custeio do orçamento municipal. Desde 2022, está incorporado ao Plano Plurianual (PPA) 2022-2025, com a previsão de destinar pelo menos R$ 5 bilhões com base nos critérios do índice. O projeto nasceu a partir de uma parceria entre a Rede Nossa São Paulo e a Fundação Tide Setubal, por meio da iniciativa Reage SP.

O cálculo do IDRGP considera três dimensões principais:

  • Vulnerabilidade social: mede a concentração de população em situação de pobreza;
  • Demografia: avalia a distribuição populacional nas subprefeituras;
  • Infraestrutura urbana: analisa a disponibilidade de serviços públicos essenciais.

Em 2024, o índice foi atualizado com base nos dados do Censo 2022 e do Cadastro Único (CadÚnico), o que provocou ajustes nos percentuais das subprefeituras. Regiões como Capela do Socorro e Parelheiros tiveram aumentos significativos nos seus índices, enquanto áreas menos vulneráveis, como Pinheiros, viram seus percentuais caírem.

Quanto foi o orçamento destinado às áreas mais vulneráveis?

Apesar de uma previsão inicial de R$ 5 bilhões para o quadriênio do PPA, a execução orçamentária surpreendeu: entre 2022 e 2024, foram liquidados R$ 12,9 bilhões em ações regionalizadas, mais que o dobro do previsto – e metade desse valor foi executado apenas em 2024.

Porém é importante reforçar que o orçamento total da cidade de São Paulo também cresceu muito nos últimos anos. A previsão de R$ 247 bilhões em despesas para os três primeiros anos do PPA foi superada em mais de R$ 60 bilhões, chegando a R$ 307 bilhões. Os investimentos liquidados somaram R$ 28,8 bilhões.

Mesmo com esse aumento expressivo de receitas e investimentos, a distribuição regional dos recursos continua concentrada nas subprefeituras com menor índice de vulnerabilidade social.  

Quem recebeu mais recursos? Quem ficou para trás?

O relatório IDRGP 2024, analisado pelo Grupo de Trabalho Democracia Participativa (GTDP) da Rede Nossa São Paulo, mostra distorções relevantes na alocação dos recursos:

  • 3 Subprefeituras tiveram despesas ‘Acima do Alvo’: Sé, Lapa e Capela do Socorro. A Sé recebeu R$ 2,94 bilhões, ou 12 vezes o alvo; a Lapa recebeu o triplo; e a Capela do Socorro, com R$ 1,55 bilhões, recebeu 46% além do alvo.
  • 9 Subprefeituras receberam valores estatisticamente ‘Dentro do Alvo’, sendo: Cidade Ademar, Butantã, Guaianazes, Ipiranga, Mooca, Vila Maria/Vila Guilherme, Vila Mariana, Santo Amaro e Pinheiros.
  • 20 Subprefeituras ficaram ‘Abaixo do Alvo’.
Índice de Distribuição Regional do Gasto Público (IDRGP 2022 a 2024) - Status do IDRGP real quanto ao atingimento do IDRGP alvo

Esses resultados refletem uma realidade estrutural do orçamento público: os gastos estão concentrados em regiões onde o custeio é maior, geralmente mais bem estruturadas, e não necessariamente nas áreas que deveriam ser priorizadas com novos investimentos.

Mesmo com critérios técnicos como o IDRGP, a execução orçamentária ainda favorece os territórios com menor vulnerabilidade social. Além disso, a simples alocação do índice alvo não garante a redução das desigualdades. É essencial avaliar se os recursos investidos estão, de fato, contribuindo para melhorar as condições de vida nas regiões mais vulneráveis e promovendo uma cidade mais justa e equitativa.

Como melhorar a aplicação do IDRGP?

Apesar de ser uma iniciativa inovadora e necessária, a efetividade do IDRGP depende de compromisso político, transparência e fiscalização social. O índice precisa:

  1. Guiar efetivamente a execução orçamentária, não apenas servir como referência técnica.
  2. Ser incorporado às leis orçamentárias anuais (LOAs) de maneira mais vinculante.
  3. Contar com instrumentos de controle social e de participação cidadã que assegurem que os recursos cheguem a quem mais precisa.

A atual gestão municipal precisa se comprometer não apenas com a ampliação dos recursos, mas com a sua correta distribuição, revertendo décadas de negligência às regiões mais vulneráveis de São Paulo.

Ouça o Programa Nossa Cidade da rádio Eldorado FM (107.3) com a participação de Igor Pantoja, coordenador de relações institucionais do Instituto Cidades Sustentáveis (veiculado em 03 de julho de 2025).

A Rede Nossa São Paulo segue atenta

A Rede Nossa São Paulo, em parceria com diversos grupos da sociedade civil, segue monitorando a execução do orçamento municipal, defendendo uma cidade mais justa e equitativa. Ferramentas como o IDRGP são fundamentais, mas precisam ser aperfeiçoadas e respeitadas na prática.

Enquanto os números revelarem distorções, a luta pela regionalização justa do orçamento continua sendo um dos pilares do nosso trabalho por uma São Paulo menos desigual.

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